sábado, 11 de fevereiro de 2012

A ALTA MATEMÁTICA DAS ABELHAS GEÔMETRAS



Abelhas

Introdução

Assegura o escritor belga Maurice Maeterlinck (1862-1949) que as abelhas, na construção de seus alvéolos, resolvem um problema de “alta matemática”. Aqui tentamos explicar o chamado problema das abelhas, a razão da forma hexagonal do alvéolo e o caso do célebre ângulo de fechamento na cobertura rômbica do alvéolo que assombrou os matemáticos, os teólogos e os naturalistas da Europa.

Por que as abelhas constróem seus alvéolos?

Com uma única finalidade a abelha constrói os seus curiosos alvéolos: é para neles depositar o mel que fabrica. Esses alvéolos são feitos de cera. Levadas (afirmam os sábios pesquisadores) por um instinto admirável, as abelhas procuram obter para seus alvéolos uma forma que seja a mais econômica, isto é, que apresente “maior volume” ou maior capacidade, para a menor porção de material empregado.
Dentro desse plano de trabalho, é preciso que a parede de um alvéolo sirva também ao alvéolo vizinho. Logo, o alvéolo não pode tez forma cilíndrica, pois, do contrário, não haveria paredes comuns e o desperdício de material seria enorme. Era preciso, pois, para o alvéolo, adotar uma forma prismática.

A forma prismática dos alvéolos

Os prismas (os alvéolos) devem encher totalmente o espaço sem deixar interstícios. As paredes devem ser comuns.
Os únicos prismas regulares que podem ser justapostos sem deixar interstícios são: o prisma triangular, o quadrangular e o hexagonal. Desses três prismas regulares qual será o mais econômico? Em outras palavras: Qual dos três prismas (tendo áreas laterais iguais) apresenta maior volume?

Prisma hexagonal: o mais econômico

Digamos que com uma certa porção Q, de cartolina, fabricamos o prisma triangular; com a mesma porção Q, um prisma quadrangular e, ainda, com a mesma porção Q, um prisma hexagonal (como indica a figura). Os três prismas são supostos abertos em cima e embaixo. (As bases não são levadas em conta.)

Prismas regulares

As três únicas maneiras com que podemos fechar o espaço com prismas regulares e iguais sem deixar interstícios:
  • com prismas quadrangulares iguais (ângulo de 90º);
  • com prismas triangulares regulares iguais (ângulo de 60º);
  • com prismas hexagonais regulares iguais (ângulo de 120º).
Observem que 60º, 90º e 120º são os divisores de 360º e ângulos internos de polígonos regulares. As abelhas preferiram o prisma hexagonal por ser o mais econômico.
As áreas laterais dos três prismas são iguais. Podemos, portanto, assegurar que esses prismas apresentam, em suas bases, polígonos isoperímetros (com o mesmo perímetro).
Designemos por a, b, e c, respectivamente, as arestas das bases dos três prismas. Temos, portanto:
  • Perímetro do triângulo: 3a;
  • Perímetro do quadrado: 4b;
  • Perímetro de hexágono: 6c.
Mas como os três polígonos são isoperímetros, temos:   3a = 4b = 6c.
Com o auxílio das relações:   3a = 4b    e    3a = 6c
Podemos exprimir as arestas b e c em função de a (aresta do triângulo). Temos:   b = 3a / 2        c = a / 2
As três arestas básicas dos prismas são, respectivamente:
a3a / 4a / 2
Conhecidas as três arestas podemos, com auxílio da Geometria, calcular o volume desses três prismas.

prismas regulares

Dos três prismas regulares a abelha escolheu o hexagonal por ser o mais econômico.
Sabemos que o volume de um prisma regular (esse é o caso) é igual ao produto da área da base pela altura. A altura h dos prismas é supostamente igual à unidade. Basta, portanto, calcular as áreas das bases.
Essas áreas, de acordo com a Geometria, são:
area1área 2área 3
A comparação desses volumes torna-se mais simples com a supressão do fator comum a 2 . Escrevemos:
9
Qual desses três números é o maior? Qual o prisma de maior volume?
Vamos substituir Raiz de 3 pelo seu valor aproximado, 1,73 e obteremos os três números (aproximados):
6,92910,38
O terceiro (que corresponde ao prisma hexagonal) é o maior.

Conclusão:

O prisma mais econômico é o prisma hexagonal, pois é aquele que apresenta, para o mesmo gasto de material, maior volume, isto é, maior capacidade. Foi por esse motivo que as abelhas, para os seus alvéolos, adotaram a forma hexagonal.

Alvéolos

Como são colocados, para maior economia de espaço, os alvéolos das abelhas. A parede de um alvéolo serve para outro alvéolo. Não há entre os alvéolos espaço perdido e a forma hexagonal é a mais econômica.
O problema das abelhas, porém, não está terminado.

Como fechar os alvéolos para conseguir a máxima economia de material?

Já nesse ponto o problema torna-se mais delicado, pois só pode ser resolvido com os recursos da Trigonometria e do Cálculo Infinitesimal (teoria dos máximos e mínimos).
A fórmula adotada pela abelha geômetra foi a seguinte: o fundo de cada alvéolo é formado de três losangos iguais. Com essa forma rômbica, em vez de fundo raso (plano) as abelhas, economizam um alvéolo em cada cinqüenta. Em milhões e milhões de alvéolos essa pequena economia de 1 em 50 é incalculável.

O fundo de cada alvéolo é formado de três losangos iguais

Eis como as abelhas colocam os seus alvéolos hexagonais. Esses alvéolos, para maior economia de material, são fechados por três losangos iguais. O valor constante do ângulo agudo de um losango de fechamento causou sério debate entre teólogos, naturalistas e matemáticos.

A precisão das abelhas na construção dos alvéolos impressiona os matemáticos e físicos

Sim, o sistema de fechamento com três losangos é o mais econômico. O físico René-Antoine Feichant de Reaumur (1683-1757) notou que, no losango de fechamento, o ângulo agudo era constante. Não variava. O fato intrigou Reaumur. Mandou buscar alvéolos na Alemanha, na Suíça, na Inglaterra, no Canadá e até na Guiana – e todos apresentavam o losango de fechamento com o mesmo ângulo.
O astrônomo francês Jean-Dominique Maraldi (1709-1788) mediu com maior precisão o tal ângulo agudo, e achou 70º32' em todos os alvéolos. O ângulo obtuso seria o suplemento e media, portanto, 109º28'.
A constância do ângulo (70º32') em todos os alvéolos impressionou Reaumur. Algum motivo tinha a abelha para adotar aquele ângulo em todos os alvéolos.
Seria, ainda, a latejar no instinto do animal, a questão de economia de material? E aquele ângulo seria o ângulo certo para o caso?
Resolveu Reaumur consultar o seu amigo e notável matemático Samuel König (1712-1757), alemão de nascimento, mas radicado na França. O problema foi proposto ao eminente algebrista nos seguintes termos:
É dado um prisma hexagonal regular. Esse prisma é fechado em uma de suas extremidades, por três losangos iguais. Pergunta-se: Qual deve ser o ângulo desse losango de modo que se obtenha, para o prisma, um volume máximo com a maior economia de material?
Convém dizer a verdade: König desconhecia as pesquisas feitas por seu amigo Reaumur, e ignorava os trabalhos de Maraldi. König jamais pensara que estaria destinado a calcular alvéolo de abelha.
É claro que König, o maior matemático alemão de seu tempo, rival do célebre Maupertius, resolveu o problema do ângulo u do losango e achou:
u = 70º 34'
E concluiu: “É esse o ângulo que deverá ser adotado para o prisma mais econômico.
O resultado apresentado pelo prestigioso matemático assombrou o mundo científico da França.
  • Ângulo calculado pelo matemático: 70º34'.
  • Ângulo calculado pelas abelhas: 70º32'.
– As abelhas erravam. Mas o erro é mínimo – diziam alguns teólogos. Erravam na construção de seus alvéolos porque obra perfeita só Deus poderia fazer!
Sim, o erro no ângulo, de dois minutos, só poderá ser apreciado com aparelhos de precisão.
Os naturalistas afirmavam que o erro cometido pelas abelhas geômetras deveria resultar da natureza do material empregado. O matemático abordara a questão teórica, mas o pequenino inseto era obrigado a encarar o problema prático, problema da vida.
Alguns naturalistas (não matemáticos) entraram nos debates.
– O fato – diziam os naturalistas – é que as abelhas, apontadas como geniais, erram e o esclarecido König, com seus cálculos, descobriu o erro das geômetras irracionais!

As abelhas é que estavam certas!!!

Houve, porém, um fato impressionante que modificou inteiramente a face do problema das abelhas. Um matemático inglês, Collin Mac-Laurin (1698-1746), quatro anos mais velho que König, informado do caso, resolveu entrar também na questão, isto é, abordar o problema das abelhas.
Retomou o problema, aplicou as fórmulas e resolveu com os recursos do Cálculo Diferencial. E achou que König havia errado. O ângulo do losango, para o alvéolo mais econômico, deveria medir precisamente 70º32'.
Era esse o ângulo que as abelhas adotavam!
A revelação de Mac-Laurin, publicada, e traduzida, causou novo escândalo no meio científico europeu. Novos debates surgiram entre os cientistas.
König, o respeitável matemático, nome consagrado pela Academia de Ciências, havia errado! A verdade estava com as abelhas.
Procedeu, porém, Mac-Laurin dentro de uma ética impecável. Declarou que seu colega König errara por ter utilizado em seus cálculos uma tábua de logaritmos que tinha um erro. Revelou Mac-Laurin qual era essa tábua e onde estava o erro, do qual resultara, para o ângulo do losango, uma pequena diferença de dois minutos.

Na construção dos alvéolos as abelhas resolvem um problema de alta matemática

Depois da revelação de Mac-Laurin reacenderam-se, com maior violência, os debates em torno do caso.
A Ciência vinha provar que as abelhas resolviam, na construção de seus alvéolos, um problema de alta Matemática:
1º) Calculavam o volume V do prisma em função do ângulo x do losango de fechamento (esse cálculo é complicadíssimo) ;
2º) Tornavam a derivada de V em relação a x (operação bastante trabalhosa) ;
3º) Igualavam a zero essa derivada e resolviam a equação trigonométrica resultante. Essa equação só podia ser resolvida com o auxilio de logaritmos.
Em relação ao índice da dificuldade desse problema podemos garantir o seguinte:
O curso de Matemática (da escola primária até o fim do científico) feito durante 11 anos não fornece a um jovem, bastante aplicado e inteligente, recursos suficientes para que ele possa   compreender e resolver o problema das abelhas, isto é, o problema completo que as abelhas resolvem quando constroem os seus alvéolos.
A verdade é esta. Já disse o Padre Leonel Franca, S. J. : “A realidade não se destrói; os fatos não se suprimem.
Maeterlinck tinha razão. As abelhas resolvem um problema de alta Matemática. São geômetras e essa espantosa capacidade matemática das abelhas é um mistério para a Ciência, mistério que os sábios jamais poderão desvendar.
Nota – Deseja o leitor fazer a idéia da pequenez de um ângulo de 2' (dois minutos)? É muito simples. Trace um segmento retilíneo com 1 metro de comprimento. Vamos chamar AB esse segmento. No extremo A levante uma perpendicular AC que tenha 1,16mm de comprimento (um milímetro e dezesseis centimilímetros). Una, a seguir, o ponto C ao extremo B. Obtemos, desse modo, um triângulo retângulo ABC. O ângulo agudo B, desse triângulo, mede 2' (aproximadamente).
Indicamos, para o caso, uma solução que nos parece mais simples e mais imediata. Tome a primeira linha desta nota. Essa linha começa pelo letra N e termina pela letra O.
Una com dois segmentos retilíneos o ponto extremo da haste inicial da letra N, aos extremos da letra O no final da linha. Vai obter um ângulo agudo muito pequeno. Esse ângulo é de 1 grau (aproximadamente).
Pois esse ângulo vale 30 vezes o ângulo de 2 minutos, ângulo que as abelhas medem com absoluta precisão.

Curiosidade

O ângulo notável

Figura do losango que aparece no alvéolo das abelhas

Figura do losango que aparece no alvéolo das abelhas.
O ângulo agudo de 70º32', que as abelhas adotaram, torna o alvéolo mais econômico: máximo de volume para um mínimo de material. O verdadeiro valor desse ângulo foi determinado pelo inglês Mac-Laurin.

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